Projeto de Lei 442/19, que tramita na Câmara propõe punição para os advogados que receberem honorários de origem ilícita

Por Dr. Wander Barbosa em

Inicialmente, é sabido elucidar que atualmente os honorários advocatícios são previstos pelo Estatuto da Advocacia e da OAB “Lei n. 8.906 de 1994”, que preconiza em seu artigo 22, caput: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência”.

Nota-se que a lei estabelece três espécies de honorários, sendo certo que o advogado tem direito a somente dois deles:

  1. Honorários convencionados ou contratuais
  2. Honorários arbitrados
  3. Honorários de sucumbência.

Como visto, é notável que a profissão de advogado, assim como as demais, vem passando por profundas transformações nas últimas décadas, antigamente o advogado era vista como um ser mítico, único e artesanal.

Com as mudanças ocorridas na sociedade e o amadurecimento do capitalismo nacional, sai de cena o advogado artesanal para dar lugar aos advogados corporativos, o surgimento das grandes bancas de profissionais, as demandas judiciais em massa e o alinhamento dos advogados com o demais profissionais, inseridos agora num ambiente de forte concorrência, competitividade e lucro.

O estabelecimento de um mercado de trabalho livre trouxe inúmeros benefícios aos advogados, que agora se tornam ultraespecialistas em determinadas áreas do direito como forma melhor atender as novas demandas sociais e empresariais, exigindo do profissional conhecimento extra em administração, finanças, economia, recursos humanos, como requisito mínimo de sobrevivência neste novo ambiente.

Contudo, nem sempre a realidade é boa e este novo cenário profissional também trouxe consigo advogados pouco preocupados com a ética, interessados unicamente em angariar clientes e expandir seus lucros, utilizando-se, para tanto, de expedientes ilegais e das prerrogativas da função.

 

Nos dias atuais, os noticiários mostram que são inúmeros os ilícitos praticados pelos maus profissionais da advocacia, dentre os quais podemos citar o envio de produtos e informações a clientes presos, estelionato, fraudes processuais e até crimes financeiros e econômicos envolvendo a constituição de offshore companies no exterior como forma de evasão de divisas e crimes tributários.

Infelizmente os fatos mostram que a situação pode não ser tão honesta quanto parece, já que dia após dia advogados e clientes vem sendo indiciados e processados por lavagem de dinheiro.

O esquema consiste basicamente em utilizar o sigilo profissional do advogado como forma de lavagem de dinheiro.

Melhor dizendo, um advogado que geralmente costuma cobrar R$ 20 mil de honorários combina com seu cliente criminoso que ira emitir uma nota de serviço superfaturada no valor de R$ 100 mil, assim, o cliente efetua o deposito de R$ 100 mil e posteriormente o advogado lhe devolve a diferença de R$ 80 mil, transformando o dinheiro ilícito em licito, sem a necessidade de informar aos órgãos estatais a procedência dos valores, alegando tratar-se de honorários livremente pactuados pelas partes.

Como observado, o assunto é delicado e bastante recente, considerando as novas mudanças trazidas na Lei de lavagem de dinheiro, Lei n. 9.613 de 1998 alterada pela Lei n. 12.683 de 2012, que expandiu em seu artigo 9º o rol de profissionais obrigados a apurar a origem e o destino dos valores recebidos e movimentados por eles e seus clientes, além do dever de informar ao Estado sobre operações suspeitas.

No rol do artigo 9º, não está expresso o termo advogado, contudo, esta previsto o dever de fornecer informações os profissionais que exercem atividade de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza, em operações imobiliárias, questões societárias, alienação ou aquisição de direitos sobre contratos relacionados a atividades desportivas ou artísticas profissionais, entre outros, atividades esta que, nos termos do artigo 1, II, do Estatuto da OAB, são também privativas de advogados:

Art. 1º São atividades privativas de advocacia:

I – a postulação a órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;

II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.

Observa-se que a lacuna deixada pela lei e o receio dos advogados honestos em fornecer informações ao Estado que possam prejudicar a defesa de seus clientes acabou por dividir a doutrina em duas opiniões, onde a primeira defende que o advogado não tem o dever de investigar a origem do dinheiro, nem tampouco oferecer informações sobre seus clientes, em respeito ao sigilo profissional, já a segunda defende a inclusão dos advogados no rol de profissionais obrigados a fornecer informações sobre as operações que tenham prestado assessoria, consultoria.

Diante deste cenário, ainda aguardando designação de relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Casa Legislativa, se encontra tramitando na Câmara dos Deputados o PL 442/19, que estabelece pena de três a dez anos de reclusão, iniciado em regime fechado, mais multa para advogado que receber honorários advocatícios tendo conhecimento da origem ilícita dos recursos de sua remuneração.

O projeto altera a Lei Nº 9.613, DE 3 DE MARÇO DE 1998, que dispõe sobre os crimes de lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores.

A mesma pena de ocultação de bens será aplicada para o causídico que receber dinheiro de origem ilícita.

O texto é baseado no PL 4.341/12, do ex-deputado Chico Alencar, que estabelecia uma nova legislação sobre armas e munições no Brasil, onde em seu artigo 78 do Projeto revoga expressamente a Lei nº 10.826/03 “estatuto do desarmamento”. No entanto, é óbvio que revogar uma lei não significa deixar um tema sem regulamentação e esta se encontra prevista no novo PL.

Ademais, o PL 4.341/12 também tinha como objetivo preserva o direito ao porte de arma em todo o território nacional para os integrantes das forças de segurança públicas estaduais conforme disposto no artigo 25, §3º e federais artigo. 27 parágrafos único da Lei nº 10.826/03.

A concessão de porte de arma aos militares seja da ativa ou da reserva, fica a critério do respectivo Comando da Força a que pertençam, com validade em todo o território nacional conforme elucidado no art. 25, 6º. Cabe elucidar que o PL 4.341/12 previa em seu artigo 74 a idade mínima, onde voltaria a ser de 21 anos.

Entretanto, a proposta foi arquivada ao final da legislatura passada, sendo assim, a proposta desse ano foi reapresentada pelo deputado Rubens Bueno, o qual considerou que o texto traz punição objetiva para quem recebe dinheiro que sabe ser ilícito, alegando que “o pagamento de honorários advocatícios por criminoso, com recursos da atividade criminosa, tem o condão de lavar o dinheiro, que entra no mercado sem quaisquer vestígios de sua origem“, afirmou o autor.

Saindo da esfera manifestamente ilícita nos restar saber como fica a situação dos advogados honestos que recebem seus honorários como forma de remuneração pelos serviços juridicamente prestados de forma legal, estes tem o dever de apurar a origem do dinheiro?

Sob a pena de cometerem o crime de lavagem de dinheiro?

É importante levar em consideração que o escopo da lei de lavagem de dinheiro é garantir a rastreabilidade do capital para que as autoridades públicas possam conhecer o caminho entre a infração e o destino dos bens.

Não se impõe ao advogado o dever de investigar a origem do dinheiro ou os atos que justificaram sua aquisição, o que exige-se apenas que seu recebimento seja registrado e anotado, para que os responsáveis pela investigação, dentre os quais não está o profissional liberal, e que tenham à sua disposição elementos para construir a cadeia de distribuição de eventuais recursos ilícitos.

 

Contudo, como advogado, compreendo que não é dever do advogado investigar a origem do honorários recebidos pela prestação honesta e justa de um serviço jurídico, tampouco não é dever informar o Estado sobre bens e valores movimentados por seus clientes, em respeito ao sigilo profissional.

O assunto é realmente bastante complexo, como também compreendo ser difícil a atividade do legislador em estabelecer critérios objetivos para identificar e combater os advogados desonestos que utilizam o sigilo profissional como instrumento de lavagem de dinheiro.

Porém, é importante frisar que o tema em análise tem exemplos de soluções na legislação internacional, que o Brasil, em verdade não precisa se limitar à discutir sobre o assunto, nem tampouco eximir completamente os advogados dos órgãos de fiscalização ordinários, fechando os olhos os maus profissionais que constantemente mancham a reputação da própria OAB e dos advogados honestos.

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