NATUREZA JURÍDICA DAS ASSOCIAÇOES DE SOCORRO MÚTUO E PROTEÇAO VEICULAR

Por Dr. Wander Barbosa em

Wander Rodrigues Barbosa

Master Off Law (LLM) em Direito Empresarial IBMEC – São Paulo -SP. wander.barbarbosa@wrbarbosa.com.br

 

Requisitos para desconsideração da natureza jurídica de uma associação de socorro mútuo e proteção veicular.

É sabido que a nossa Lei maior estabeleceu como princípio básico a plena liberdade de qualquer cidadão para associar-se, exercer qualquer profissão e praticar qualquer ato, não proibido por lei.

Leis que autorizam funcionamento das Associações de Proteção Veicular

Art. 5º. CF/88 – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

(…)

XVIII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;

(…)

Nos incisos Xlll e XVll, assegura a Lei Maior a liberdade no exercício de qualquer ofício ou profissão, atendidas, apenas, as qualificações profissionais que a lei estabelecer, bem como o direito de associar-se.

As Associações de proteção veicular além de terem sua previsão e criação alocadas na Constituição Federal possuem natureza jurídica diversa, com sua base e estrutura e funcionamento no mutualismo puro e autogestão.

Nota-se que não há qualquer relação, mesmo que forçosa, do sistema associativo de mútua assistência com o seguro, que prevê pagamento de prêmio, ou seja, antecipação de pagamento para resultado incerto.

Desta forma, para que qualquer outro negócio jurídico possa confundir-se com o seguro, indispensável apresente todos os requisitos específicos do tipo definido pelo art. 757, a saber:

  1. que alguém, denominado segurador, garanta interesse legítimo de outrem, denominado, segurado;
  2. a prestação dessa garantia pressupõe o pagamento de uma importância, chamada prêmio;
  3. e, finalmente, a obrigação do segurador visa garantir os interesses do segurado contra os riscos

COMO FUNCIONA O RELACIONAMENTO ENTRE ASSOCIADO E ASSOCIAÇÃO?

O primeiro embate à combatida identidade entre os institutos, é o fato deste constituir, conforme se depreende do exposto acima, um contrato sinalagmático, através do qual o segurador se compromete a indenizar o segurado pelo prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato, e esse a pagar-lhe em contraprestação o prêmio ajustado.

Na proteção veicular, contudo, exercida através de uma associação de ajuda mútua à despeito de vários serviços, o valor dos ressarcimentos (que, no seguro, são indenizações e de responsabilidade do segurador) é rateado entre os associados, inclusive, a vítima do fato.

Não há, assim, uma oposição entre os participantes, como nos contratos tradicionais em que cada parte defende interesses próprios em oposição aos da outra; o objetivo de todos é comum, tornando os interesses individuais totalmente irrelevantes, diante daquele representado pelo grupo.

É o contrato, chamado por Ascarelli como plurilateral exatamente, porque, ao contrário dos contratos tradicionais, não há relação jurídica dos participantes entre si, mas de cada um deles com o todo.

Ocorre que na proteção veicular não há recolhimento de valor antecipado — ou captação. O pagamento pelo associado somente ocorre após apurado o valor dos danos ou serviços prestados aos demais associados, sendo rateado entre os participantes.

QUANTO CUSTA ADERIR A UMA ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO VEICULAR?

O valor cobrado a título de mensalidade é ínfimo e serve tão somente para gestão da Associação como pagamento de funcionário, aluguel do local onde funciona a associação, água, luz, telefone e demais gastos para o funcionamento da Associação e jamais a título de lucro.

Não há margem de lucro, seja da associação que simplesmente se encarrega de arrecadar a cota parte de cada um dos associados nos rateios para incontinente, transferi-la aos prestadores de serviços (oficinas, casas de peças, etc.) ou dos associados cujos veículos desapareceram ou não têm condições de, economicamente, serem recuperados; e, nem dos associados, os quais simplesmente recebem as indenizações necessárias a cobrir o seu prejuízo.

Para obter mais informações sobre a constituição e gestão de uma Associação voltada a proteção veicular, acesse esse artigo.

É, portanto, exatamente em razão da inexistência de interesse econômico das associações e pelos baixíssimos valores arrecadados dos associados que são estabelecidas regras diferenciadas   e condições específicas para que   haja a possibilidade de custeio, pela associação, dos danos ocasionados pelo associado.

Referidas regras, extraídas de seu Estatuto Social ou do seu Regulamento, constituem-se em documento hígido, válido e lícito, cuja submissão é condição basilar para admissão de qualquer associado.

A adesão do Associado  nos quadros da associação, portanto, decorre de manifestação inequívoca quanto aos termos contidos em seus documentos reguladores, exercendo, de livre e espontânea vontade, sua liberdade de associação contida no Art. 5º,  XVIII da Constituição Federal.

Portanto, afastar a condição de associação, tão somente seria admissível após procedimento específico, sujeito ao contraditório, oportunidade em que seria possível demonstrar a gestão integralmente voltada ao associativismo.

Seria possível demonstrar, inclusive, a intimação do associado para participação das assembleias, com registro de voto e interferência direta na gestão da entidade, inclusive com candidatura a cargos postos em votação.

Igualmente, por meio de procedimento específico, seria admissível à requerida apresentar seus relatórios contábeis e comprovar a ausência de distribuição de lucros ou dividendos, revertendo-se integralmente em prol dos associados os superávits eventualmente alcançados.

Com efeito, eventual afastamento de sua natureza, sem que se adote os procedimentos legais específicos, estaria violando frontalmente o Artigo 5º, Inciso XVIII da Constituição Federal que dispõe expressamente ser vedada a interferência estatal em seu funcionamento:

Por definição legal (art. 53, Código Civil), “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”.

Trata-se, portanto, de modelo organizacional pelo qual, pessoas naturais ou jurídicas se unem em busca de objetivos demandados pela coletividade, não atrelados à lucratividade.

Dada a sua índole congressional, o formato associativo decorre, exclusivamente, de ato intervivos. O direito de se reunir associativamente para fins lícitos insere-se – como não poderia deixar de ser num Estado que se intitule democrático – entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão (art. 5º, XVII a XXI, Constituição da República), restando expressamente vedada qualquer interferência estatal nos atos de gestão das entidades compostas por pessoas (art. 5º, XVIII).

 

Art. 5ª (…)

XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

Sua existência legal está efetivamente caracterizada por meio da inscrição de seus atos constitutivos no órgão público de registro (arts. 45, Código Civil, 114 e 119, Lei nº 6.015/73 – Lei de Registro Público) – no caso específico, Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas.

Desta forma, tendo sido constituída e gerida em harmonia com as disposições legais obrigatórias, atendendo exaustivamente a todos os requisitos, sua descaracterização sujeita-se a procedimento próprio.

Em resumo, as associações extinguem-se por deliberação dos associados, por ação do Ministério Público ou de qualquer interessado, podendo o desfazimento processar-se administrativa ou judicialmente (arts. 51[1] e 61[2], Código Civil) e não de forma sumária sem a presença do contraditório, por decisão interlocutória do juiz.

À toda evidência, qualificar a associação como fornecedora de serviços equivale-se a procedimento que extingue sua existência na forma em que foi constituída, o que, à toda evidência, contraria violentamente os dispositivos constitucionais supracitados.

Com efeito, eventual ataque ao exercício dessa liberdade, devem os gestores constituir advogado especialista em associações de socorro mútuo e proteção veicular para que prevaleça o império da justiça e moralidade.

[1] Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua.

[2] Art. 61. Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso, as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56 , será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.


Dr. Wander Barbosa

Wander Barbosa, CEO do escritório Wander Barbosa Sociedade de Advocacia. Master Of Law Direito Empresarial. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil. Pós Graduado em Direito Penal. Especializado em Recuperação Judicial e Falências pela Escola Paulista da Magistratura.

2 comentários

Dr. Wander Barbosa · 24/10/2022 às 2:14 am

Dr. Wander Barbosa. Advogado Especialista em Associações de Socorro Mútuo e Proteção Veicular.

ADVOGADO ESPECIALIZADO EM ASSOCIAÇÕES DE PROTEÇÃO VEICULAR ANALISA PROPOSTA LEGISLATIVA QUE PRETENDE ANULAR PUNIÇÕES – Wander Barbosa Advocacia - Advogado em São Paulo · 10/06/2023 às 3:30 am

[…] escritório Wander Barbosa Advocacia, especializado em Associações de Proteção Veicular e Socorro Mútuo, analisa a propositura do senador Paulo Paim (PT/RS) que apresentou projeto de lei que altera o […]

Os comentários estão fechados.

Whatsapp
1
Precisa de ajuda?
Olá, sou Wander Barbosa.

Espero que o conteúdo do nosso site seja útil e adequado à sua realidade.

Não achou resposta para sua dúvida no site?

Envie-a pelo Whatsapp para que eu e minha equipe possamos entender melhor seu caso.

Será um prazer lhe atender!
Nossa política de governança de dados poderá ser acessada em https://www.wrbarbosa.com.br/wp/contato/privacidade/