Má conduta do depositário judicial que detém guarda dos bens penhorados autoriza bloqueio de dinheiro do devedor
Inicialmente, para um amplo entendimento e compreensão da matéria que será aludida, é sabido salientar que a figura do fiel depositário surgiu da necessidade de guarda de bens que estejam sob a tutela judicial.
O modo como é concretizada a guarda e administração de bens é também um ónus necessário à guarda dos bens penhorados ou apreendidos no âmbito de um processo judicial.
Já no que diz respeito a responsabilidade civil do depositário infiel, por culpa ou dolo, esta se encontra prevista no art. 77, parágrafo 2º do novo CPC, que vai de até vinte por cento sobre o valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta ou de até 10 (dez) vezes o valor do salário mínimo, quando for irrisório ou inestimável o valor da causa segundo os termos do art.77, parágrafo 5º do novo CPC.
Sendo assim, no que tange à sanção penal, o depositário responderá patrimonialmente por culpa ou dolo na hipótese de causar prejuízo à parte, e estará sujeito ainda ao pagamento de multa por ato atentatório à dignidade da justiça.
Ademais, o depositário infiel também se sujeita expressamente a sanções penais, que não poderão colidir, entretanto, com a regra fundamental de vedação à prisão por dívida, mas terão aplicação, por exemplo, nas hipóteses de apropriação indébita ou estelionato, nas suas várias formas, já havendo julgados sobre tais temas antes mesmo da referência do novo código de processo civil.
Como advogado, no âmbito empresarial e Direito de família, compreendo que em tais situações, sob o aspecto penal, o depositário infiel poderá ser processado criminalmente por ter eventualmente cometido crimes que levaram à impossibilidade de restituição do bem objeto do depósito, e representaram uma vantagem ilícita ao depositário, que se apropriou do bem ou vendeu-o a terceiros.
Embora não seja objeto especificamente das considerações aqui trazidas, mas, com o intuito de tentar contribuir com os debates sobre o novo código, em específico do depositário judicial que detém da guarda dos bens penhorados, deve-se destacar que a despeito da exclusão da referida ação de depósito da nova codificação, como ação nominada de procedimento especial, a nova tutela de evidência prevista no art.311, III, do novo código, estabelece que a tutela será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito.
Nestes casos, será decretada, liminarmente, a ordem de entrega do objeto depositado, sob pena de cominação de multa diária. Já, no caso de bens apreendidos e mantidos sob a guarda de depositário judicial cujo paradeiro é desconhecido, é válida a ordem de bloqueio de dinheiro do devedor, até o valor total da dívida.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recente decisão no Recurso Especial Nº 1.758.774 – SP (2014/0346346-4), negou provimento ao recurso de um devedor que buscava afastar o bloqueio em sua conta bancária por entender que a penhora dos bens era suficiente para garantir a execução.
Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, a penhora dos bens apreendidos se frustrou porque o paradeiro do depositário é desconhecido, e não em razão de qualquer ato diretamente imputado às partes.
“Diante desse cenário, justifica-se a substituição da penhora por dinheiro, como concluiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, porque não podem os recorridos suportar o prejuízo a que não deram causa, ficando impedidos de prosseguir no cumprimento de sentença ou obrigados a fazê-lo a menor”, disse a magistrada.
Nancy Andrighi lembrou que a consequência desse ato é a devolução dos bens ao recorrente (devedor no processo), e que cabe ao depositário judicial – e não aos credores – responder pelos prejuízos a ele causados, até que se opere a devida restituição.
O recorrente era locatário de um imóvel utilizado para fins empresariais. Após inadimplência e decisão judicial para rescindir o contrato, os donos do imóvel ficaram com crédito de R$ 63 mil. Máquinas e outros bens móveis foram apreendidos no curso da ação para satisfazer a dívida.
Como os bens se encontravam em local desconhecido, o juízo de primeiro grau autorizou o bloqueio na conta do devedor, até o valor total da dívida, por meio do sistema Bacenjud.
A relatora destacou que o depositário judicial é mero detentor dos bens, e está sujeito a penalidades por não cumprir com a função.
“Como mero detentor dos bens, cabe ao depositário judicial restituí-los a quem tenha o direito de levantá-los, quando assim ordenado pelo juízo; do contrário, altera-se o título dessa detenção, podendo se sujeitar o depositário, além da indenização na esfera cível, à pena do crime de apropriação indébita, majorada pela circunstância de cometê-lo no exercício da respectiva função”, explicou Nancy Andrighi.
Contudo, como pode-se observar é facto que a figura de fiel depositário está definida legalmente, e quanto a nós, caracterizados os seus direitos e deveres. No entanto, no que à administração de bens no processo de insolvência e no processo de execução concerne, entendemos que tornar-se-ia útil clarificar a sua amplitude.
É de suma importância a boa administração dos bens penhorados ou da massa insolvente, pois só assim é possível o pagamento e ressarcimento aos credores das dívidas em mora pelos devedores. Esta é uma necessidade que deve ser assegurada num Estado de Direito, justo e equitativo, no qual se pretende garantir a eficácia da justiça, permitindo a dignidade humana dos devedores e o pagamento dos credores.
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