Cláusula arbitral não impede pedido de falência por falta de pagamento de título na Justiça

Por Dr. Wander Barbosa em

Cumpre observar, preliminarmente que a cláusula arbitral ou cláusula compromissória é um mecanismo utilizado para submeter um contrato à arbitragem. A cláusula é independente do contrato e permanece atuante mesmo em caso de invalidade isso que nos permitir ou nulidade do negócio principal.

A cláusula arbitral é fruto da autonomia das vontades, sendo de natureza estritamente negocial.

Como advogado no âmbito empresarial, compreendo que a arbitragem é um instituto importantíssimo para a apropriada resolução de conflitos na esfera extrajudicial. A agilidade nos processos e a informalidade são algumas das razões que estimulam as pessoas a optar pela arbitragem a fim de resolver os problemas que compreendam direitos patrimoniais disponíveis.

A cláusula compromissória vem prevista em um contrato, antes mesmo de o conflito existir. Ou seja, ela é uma convenção prévia, por meio da qual os interessados comprometem-se a utilizar a arbitragem a fim de resolver os litígios que, porventura, apareçam em relação ao contrato que está sendo assinado.

Impede salientar que um ponto muito importante quando analisamos o que é cláusula compromissória é entender a sua autonomia em relação ao contrato em que está inserida. Assim, a nulidade desse contrato não resulta, obrigatoriamente, na nulidade da cláusula compromissória. Cabendo ao árbitro à decisão por ofício, ou motivada pelas partes, sobre os pontos que tratam da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem, e também sobre o contrato no qual segue incluída aquela cláusula.

No caso presente, em recente decisão, Recurso Especial Nº 1.733.685 – SP (2018/0076990-4), a quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a existência de cláusula compromissória não afeta a executividade de crédito não pago e não impede a deflagração do pedido de falência previsto no artigo 94, I, da Lei 11.101/05.

Para o colegiado, o direito do credor pode ser exercido mediante provocação da Justiça, já que a arbitragem não tem poderes de natureza executiva.

A cláusula compromissória, também chamada de cláusula arbitral, é aquela na qual as partes de um contrato estabelecem que as controvérsias serão resolvidas por meio da arbitragem.

O caso analisado pelo STJ tratou de pedido de falência apresentado por uma empresa de metalurgia em relação à Volkswagen do Brasil, ao argumento de ser credora de R$ 617 mil, representados por várias duplicatas protestadas, sem que a requerida tivesse efetuado sua quitação.

Interesse de agir

A Volkswagen alegou que as partes elegeram foro arbitral e, no mérito, sustentou ter quitado R$ 425.800,45 por compensação. A requerida afirmou ter efetuado depósito elisivo nos autos.

Ao analisar a ação no primeiro grau, a juíza entendeu estar ausente o interesse de agir na propositura da demanda, por falta do prévio exaurimento da matéria no juízo arbitral, e julgou extinto o processo, sem resolução de mérito.

O Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a sentença e determinou o retorno dos autos ao primeiro grau para análise do pedido de decretação de falência.

A Volskwagen recorreu ao STJ sustentando que, ao efetuar o depósito elisivo, afastou a possibilidade de ter decretada a falência e restringiu a controvérsia a questões de direitos patrimoniais disponíveis, atraindo a jurisdição arbitral.

Arbitragem

O relator, ministro Raul Araújo, afirmou que a pactuação de cláusula compromissória possui força vinculante, obrigando as partes da relação contratual a respeitar, para a resolução dos conflitos, a competência atribuída ao juízo arbitral, com preponderância sobre o juízo estatal.

Todavia, segundo o ministro, a existência de cláusula compromissória não afeta a executividade do título de crédito não pago e tampouco impede a deflagração do procedimento falimentar previsto na legislação.

“No caso concreto, a despeito da previsão contratual de cláusula compromissória, existem títulos executivos inadimplidos, consistentes em duplicatas protestadas e acompanhadas de documentos para comprovar a prestação efetiva dos serviços, o que dá ensejo à execução forçada ou ao pedido de falência, com fundamento no artigo 94, I, da Lei 11.101/05, que ostenta natureza de execução coletiva”, observou.

Para o relator, ao celebrar a convenção de arbitragem, os contratantes optam por submeter suas controvérsias a um juízo arbitral, mas essa opção não é absoluta e não tem o alcance de impedir ou de afastar, em definitivo, a participação da jurisdição estatal.

Ação de cobrança

Segundo Raul Araújo, como o caso analisado envolve pretensão amparada em título executivo, o direito do credor somente pode ser exercido mediante provocação do Judiciário, tendo em vista que o árbitro não possui poderes de natureza executiva, e os atos de natureza expropriatória dependeriam do juízo estatal para ser efetivados.

O ministro afirmou ainda que o depósito elisivo da falência, conforme previsto pelo artigo 98, parágrafo único, da Lei 11.101/05, não é fato que autoriza o fim do processo de falência, pois o processo se converte em ação de cobrança e segue pela via executiva comum, o que seria inviável no juízo arbitral.

Ao negar provimento ao recurso da Volkswagen, o relator afirmou que o processo deve ter continuidade na jurisdição estatal. “Aparelhado o pedido de falência em impontualidade injustificada de títulos que superam o piso previsto na lei (artigo 94, I, da Lei 11.101/05), por absoluta presunção legal, fica afastada a alegação de atalhamento do processo de execução/cobrança pela via falimentar”, acrescentou.


Dr. Wander Barbosa

Wander Barbosa, CEO do escritório Wander Barbosa Sociedade de Advocacia. Master Of Law Direito Empresarial. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil. Pós Graduado em Direito Penal. Especializado em Recuperação Judicial e Falências pela Escola Paulista da Magistratura.

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