Casal consegue na justiça alteração retroativa de regime de bens de celebrada à época da comunhão.

Por Dr. Wander Barbosa em

A Lei 8.935/94 não contém previsão explícita, mas diz que o serviço notarial será prestado de modo eficiente e adequado conforme aludido em seu dispositivo legal, art. 4º.

As leis, muitas delas também fruto da falibilidade humana, endossam a natureza.

As escrituras públicas são atos administrativos notariais formados exclusivamente em decorrência da vontade das partes, como declarada ao tabelião. Os erros, portanto, podem advir das partes em face do que desejam ou do que declaram ou do próprio tabelião, ao formalizar o ato. Esta distinção, a do agente do erro, pouco interesse tem, exceto para definir quem suporta o preço da correção.

Os erros constantes em atos notariais podem ser corrigidos das seguintes formas:

1) Por ressalva final;

2) Pela cláusula “em tempo”, também ao final;

3) Por aditamento;

4) Por rerratificação.

Como advogado no Direito Civil e Direito de Família, entendo que tamanha matéria requer uma breve análise, pois o assunto envolve aspectos éticos de interesse social, no que diz respeito à conduta e prestação de serviço por funcionário público, e sua omissão ou negligência poderá acarretar grandes consequências.

Nesta esteira, compreendo que quanto as partes os erros mais comuns cometido pelo tabelião, estão relacionados aos erro na grafia dos nomes, erro na qualificação (divorciada, se declarou casada, p. ex.), erro nos números de CPF e carteiras de identidade, entre outros.

Evidentemente que estas situações devam ser consideradas em relação ao tempo do ato e, principalmente, documentadas, dentre as demais formalidades da lei, citamos, a título de exemplo, as declarações.

A falta delas, ou desacordo delas, com a vontade do declarante, só pode ser corrigida por rerratificação.

A exceção fica por conta da anuência do cônjuge que, em muitos atos, não é expressa, aceitando-se a presença e assinatura do casal como declaração de acordo. E ainda que houvesse exigência para que se suprisse, entendemos que esta seria possível através de ata declaratória ou aditamento retificativo por solicitação das partes, com a declaração da anuência.

Por sua vez, a “Ata Notarial”, instituída pela Lei 8.935/94 para corrigir erros materiais em escrituras, a lei pretendeu muito mais e a doutrina já se encarrega de rechear as infindáveis possibilidades da ata como atividade notarial a serviço das necessidades da cidadania e da sociedade. A ata notarial, contudo, não é a forma, a roupa feita sob medida para a correção de erros, ainda que em alguns notariados da América Latina seja, por vezes, utilizada.

Vemos alguns óbices que tornam a correção de erros por ata notarial incompatível com a natureza deste ato.

Na situação em epígrafe, a ata deve ter um solicitante, neste caso, se o tabelião perceber o erro ou se a parte se recusar a solicitar a correção, faltará elemento essencial ao ato, e não se pense que o tabelião deverá agir como solicitante, lavrando o próprio ato corretivo, pois esta solução representa infração ao princípio da impessoalidade, e obstado expressamente pelo artigo 27 da lei 8.935/94.

Em segundo lugar, a ata notarial tem natureza de pré-constituição probatória, instrumento a disposição da sociedade. Utilizá-la para corrigir erros ou omissões parece-nos um desvio de finalidade que constitui infração ao artigo 6°, inciso II, da referida lei 8.935/94.

Neste sentido, em recente decisão, processo Nº 1020629-22.2017.8.26.0506, a 2ª câmara de Direito Privado do TJ/SP acolheu o pedido de um casal e determinou a alteração de regime de bens (da separação obrigatória para a separação convencional), com efeito retroativo, isto é, desde a celebração do matrimônio.

Para o colegiado, a mudança não implica prejuízo a terceiros e não acarreta qualquer prejuízo aos cônjuges.

À época, o casamento foi celebrado no regime de separação obrigatória e não no regime da separação convencional, como o casal desejava, por conta de um equívoco do tabelião. Diante do erro, os cônjuges ajuizaram ação requerendo a alteração do regime de bens, para prevenir eventuais conflitos em caso de sucessão.

Em 1º grau, o pedido foi julgado parcialmente procedente, alterando o regime de bens da separação obrigatória para a separação convencional, a partir do trânsito em julgado.

O casal apelou da decisão buscando, na verdade, a retroatividade da mudança.

Ao analisar o caso, a desembargadora Rosangela Telles, relatora, concluiu que a retroatividade da alteração não implica prejuízo a terceiros e não acarreta qualquer prejuízo aos cônjuges. “Ao revés, visa assegurar os direitos do supérstite em caso de sucessão causa mortis, sendo esta a vontade inequívoca das partes que se encontram casadas há mais de 15 anos”, acrescentou.

Assim, a 2ª câmara acolheu o pedido e alterou o regime de bens, desde a celebração do matrimônio.

No caso em tela, como pode-se observar, a correção do ato notarial, implicou uma grande custa processual ao ente estatal, contudo, entende-se que é imprescindível corrigir os erros e omissões, quando detectados, o quanto antes e da maneira mais simples e menos custosa, e, em vista do princípio da unicidade da fé pública, decorrente da delegação estatal, qualquer tabelião poderá corrigir erro ou omissão constante de ato feito por outro.


Dr. Wander Barbosa

Wander Barbosa, CEO do escritório Wander Barbosa Sociedade de Advocacia. Master Of Law Direito Empresarial. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil. Pós Graduado em Direito Penal. Especializado em Recuperação Judicial e Falências pela Escola Paulista da Magistratura.

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