À Luz Do Princípio Da Socioafetividade: Vínculo Afetivo Autoriza Flexibilização de Regra Legal Mínima De Idade Para Adoção
Em primeiro plano, cumpre observar, preliminarmente que a adoção trata-se de uma medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando se esgotados os recursos utilizados na manutenção da criança ou adolescente no seio de sua família natural ou extensa, sabido elucidar que perante o ordenamento jurídico é vedada a adoção por procuração.
Assim, o adotando deve preencher alguns requisitos legais, como por exemplo, contar com no máximo dezoito anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes, entre outras, vejamos:
- O adotante tem que possuir 18 anos ou mais;
- Pode ser somente uma pessoa ou um casal, sendo homem e mulher, casados ou em união estável;
- É aceitável apenas uma das pessoas que estão adotando preencher o requisito quanto a idade;
- Entre o adotante e o adotado deve existir a diferença de 16 anos;
- Tratando-se de um casal adotante, a diferença de idade é auferida pelo adotante mais novo;
- Toda adoção exige a intervenção do Judiciário, através de ação própria;
- Sendo conhecidos os pais do adotado, exige-se a concordância pela adoção, participando do processo de adoção;
- Se o adotado contar com no mínimo 12 anos de idade, esse poderá manifestar sua vontade quanto ao processo de adoção;
- Os pais naturais, uma vez que consentirem em dar o filho em adoção, após o tramite processual, tal consentimento é irrevogável, assim, até a prolação da sentença publicação, poderá caso haja interesse das partes, voltar atrás;
- Os divorciados podem adotar em forma de casal, igual situação ocorre para os separados, desde que no processo seja apontado a questão da guarda e as visitas.
Neste sentido, exige-se ainda, que o estágio de convivência tenha iniciado durante a sociedade conjugal;
- A sentença de adoção constitui o adotado nos direitos do adotante, e vice e versa. Assim, a sentença atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de todos os vínculos com os pais e parentes naturais dele.
Ao desligar-se do parentesco natural, o adotado liga-se aos parentes consanguíneos do adotante, passando a usufruir-se do sobrenome automaticamente do adotante, cumpre salientar que só poderá ser alterado o prenome se for pedido pelos adotantes.
Os direitos da adoção começam com o trânsito em julgado da sentença, no entanto, ocorre uma exceção no caso de haver ocorrência da morte do adotante, no curso do processo; pois toda adoção é precedida pelo estágio de convivência, cumpre frisar que esse período será fiscalizado pelo juiz e antes da prolação da sentença.
Impende salientar que o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece alguns requisitos que devem ser seguidos á regra para a adoção, vejamos:
Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil.
1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.
2o Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.
Neste sentido, compreende-se que apenas os indivíduos com idade igual ou superior a dezoito anos tem o direito de adotar, conforme disciplinado no parágrafo primeiro do artigo 42, ao vedar a adoção, na qual os ascendentes ou descendentes configurariam no papel de adotante, é totalmente justificável, pois, não há necessidade da adoção, tendo em vista que pela lei, avós e irmãos configuram como os sucessores naturais da guarda das crianças que possuem pais falecidos, ausentes e até mesmo destituídos do pátrio poder.
Por óbvio, é evidente que o pai ou a mãe que reconheceu filho não pode adotar, uma vez que já existe vínculo de filiação e vinculo com a família, configurando-se com tal pedido um ato jurídico sem objeto. No entanto, é possível a adoção pelo pai ou mãe do filho havido fora da relação conjugal, neste caso, a adoção poderá se dar por adotantes casados ou que mantenham uma relação de união estável, comprovada a estabilidade familiar.
Outrossim, segundo elucidado no § 3º, “o adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando”. Nesta esteira, compreende-se que não se pode adotar um filho de idade igual ou superior à do adotante, por regra, o futuro pai ou mãe tem que ser mais velho para que possa educar de modo apropriado à criança ou adolescente e desempenhar o exercício do pátrio poder.
Na situação em epígrafe, diante das novas construções de famílias que vem crescendo atualmente, em recente decisão a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu ser possível flexibilizar – à luz do princípio da socioafetividade – a exigência de pelo menos 16 anos de diferença entre adotante e adotando, requisito previsto no artigo 42, parágrafo 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que extinguiu processo de adoção por não ter sido atendido o requisito legal da diferença mínima de idade entre adotante e adotanda.
A controvérsia teve origem com o pedido de adoção ajuizado pelo padrasto da pretensa filha, maior de idade, cujos pais biológicos se separaram quando ela tinha apenas quatro anos. A mãe e o adotante vivem em união estável oficializada desde 2007.
Vínculo Socioafetivo
No pedido de adoção, o autor informou que o pai biológico, já falecido, teve pouco contato com a adotanda. Sustentou que a relação socioafetiva foi construída ao longo de toda uma vida, e que a adoção seria consequência natural dessa circunstância. Requereu, então, a alteração do registro civil da adotanda para excluir o nome do pai biológico, substituindo-o pelo seu.
O juízo da Vara de Família extinguiu o processo de adoção alegando que o requerente não se enquadrava no requisito previsto pelo ECA, que preceitua que o adotante deverá ser, no mínimo, 16 anos mais velho que o adotando.
Na apelação ao TJRS, o adotante afirmou que a regra legal só não havia sido cumprida por diferença de poucos meses. O tribunal, no entanto, manteve a sentença.
Ao recorrer ao STJ, o autor alegou violação do ECA, afirmando existir comprovada relação socioafetiva entre ele e a adotanda – o que justificaria a flexibilização do rigor da norma e a formalização da adoção, especialmente em virtude da finalidade protetiva da lei.
Maturidade Emocional
O relator, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que o reconhecimento de relação filial por meio da adoção pressupõe a maturidade emocional para a assunção do poder familiar, a ser avaliada caso a caso.
Segundo o ministro, na situação analisada, a relação filial prevalece há mais de 30 anos, e o tempo que falta para o cumprimento da diferença mínima de idade exigida por lei é de menos de três meses. “O pedido de adoção encerra verdadeiro ato de amor, pois consolida um ambiente familiar saudável e digno, no qual a adotanda se desenvolveu plenamente e que deve transcender a taxatividade da lei“, disse.
Para Villas Bôas Cueva, a afetividade deve ser resguardada prioritariamente. O relator destacou que a adoção é sempre regida pela premissa do amor e da imitação da realidade biológica, sendo o limite de idade uma forma de evitar confusão de papéis ou a imaturidade emocional indispensável para a criação e educação de um ser humano e o cumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar.
Pedido Razoável
“No caso, o lar é estável e o pai socioafetivo apenas deseja o reconhecimento de situação fática que representa a vivência familiar, pedido perfeitamente razoável, a desafiar a instrução probatória”, observou o ministro.
Ele lembrou que o STJ tem várias decisões a respeito da possibilidade de adoção de pessoa maior, especialmente quando presente uma relação de filiação socioafetiva.
“Incumbe ao magistrado estudar as particularidades de cada caso concreto a fim de apreciar se a idade entre as partes realiza a proteção do adotando, sendo o limite mínimo legal um norte a ser seguido, mas que permite interpretações à luz do princípio da socioafetividade, nem sempre atrelado às diferenças de idade entre os interessados no processo de adoção“, concluiu.
Por fim, como advogado de família, com vasta expertise no Direito de Família, com especialidade em Adoção, dentre outras ramificações do Direito Pátrio, compreendo que atualmente o ser humano vem evoluindo gradativamente no que tange as atuais construções familiares
Hoje não existe apenas a família tradicional, composta por marido, mulher e filhos legítimos, há as diversas e inenarráveis entidades familiares, dentre elas, a resultante de união estável, resultante de união homoafetiva, monoparental, pluriparental, socioafetiva, entre outras.
O Direito de Família encontra-se diretamente ligado ao afeto, pois a base da família é o vínculo afetivo, é o que concretiza o lar familiar e o torna irrefutável.
O vínculo familiar se fortalece, quando o amor fala por ela, o atual princípio norteador do direito de família é o princípio da afetividade, posto que o mesmo atribui valor jurídico ao afeto. Tal princípio, passou á refletir significativamente em inúmeras decisões em que o critério afetivo é colocado lado a lado ao critério biológico.
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