Condomínio Não Pode Impedir Proprietário de Sublocar Seu Imóvel Por Aplicativo para Uso de Temporada

Por Dr. Wander Barbosa em

Em primeiro plano, cumpre-se observar que síndicos e moradores diariamente discutem sobre as mais variadas questões em condomínios, desse modo, aplicar multas de condomínio é uma das partes mais complicadas do trabalho do síndico, no entanto, ultimamente muito vem se debatendo entre alguns condomínios é sobre a utilização do imóvel residencial, no que diz respeito ao direito de propriedade de cada proprietário, no que tange ao direito do uso, do gozo, de fruição e de disposição do seu bem imóvel para locação por temporada, através de sites e aplicativos.

Ao aplicar, uma advertência ou multa, a primeira coisa que deve ser observada pelo síndico antes de tomar qualquer decisão é de conferir a convenção e regimento interno do condomínio, documentos estes, elaborados e confeccionados pelo condomínio, analisados por um advogado especialista em Direito Condominial, a fim de melhor estabilizar as relações condominiais .

Todavia, existem situações em que advertências não surtem efeito e deve-se partir direto para a multa de condomínio, no entanto, ao caso do morador que vir a causar prejuízo a uma área comum do condomínio, este deverá se utilizar das medidas necessárias e cabíveis conforme deve constar em convenção a fim de se buscar o devido ressarcimento pelo dano causado, senão, vejamos o dispõe o Código Civil/2002, capítulo que trata sobre Condomínios:

Art. 1336…..

  • 2o. O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

  • Único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

Neste ínterim, no que tange ao direito de propriedade, uso e gozo da propriedade do condômino, o que atualmente tem gerado muita dúvida é se pode ou não o condomínio proibir que o proprietário utilize seu imóvel para a locação por temporada?

Neste sentido deve-se dizer, que antes de se adentrar para responder à questão acima é preciso entender o que a Lei 8.245/91, entende por locação por temporada é preciso observar o diz o artigo 48 do supracitado dispositivo legal, vejamos:

Art. 48. Considera – se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.

Como pode-se observar, a grosso modo a locação por temporada é aquela que corresponde ao período de locação de até 90 (noventa) dias e sem prazo mínimo. Outrossim, é preciso, ainda, observar o que diz o Código Civil sobre o direito do proprietário de um imóvel, vejamos:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

Conforme observado, o direito de propriedade do proprietário do imóvel, por lei, abrange o direito do uso, do gozo, de fruição e de disposição. Ou seja, o proprietário do imóvel tem o direito, por exemplo, de alugar o imóvel e receber os alugueis, acrescento ainda que, a Constituição Federal garante, em seu art. 5º, XXII o direito de propriedade.

Sendo assim, em que pese o condomínio possuir áreas comuns, que devem se sujeitar a regras da coletividade de moradores, os apartamentos ou casas, áreas estas consideradas privativas, sujeitam-se ao direito de propriedade de cada proprietário, no entanto, de fato que sua utilização deve ser feita com bom senso, de forma a não ofender, nem desrespeitar direito alheio, como por exemplo, não se pode extrapolar no barulho em horários inapropriados de forma a prejudicar o vizinho.

No caso em análise, a questão que se faz de suma importância esclarecer, diz respeito ao fato do por que razão alguns condomínios pretendem proibir a utilização da propriedade dos condôminos para a locação por temporada.

A justificativa mais plausível quanto a locação por temporada, diz respeito á segurança do condomínio e á garantia ao respeito dos demais condôminos, a utilização destes imóveis por temporada sem determinação de período mínimo, e de até 90 (noventa dias), leva a uma alta rotatividade de pessoas nos condomínios, o que pode prejudicar a segurança destes locais.

Este tema, tem causado diversas discursões e controvérsias nos tribunais brasileiros, não muito recente, o Superior Tribunal de Justiça, em 2017, decidiu que o condomínio não pode proibir a locação por temporada, tendo em vista que prevista em lei, confira a breve ementa comentada:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.174.291 – SE (2017/0240403-5) RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE AGRAVANTE : CONDOMÍNIO RESIDENCIAL CLUBE ATALAIA ADVOGADO : ROBERTO BALDO CUNHA E OUTRO (S) – SE000046B AGRAVADO : TEREZA CRISTINA CERQUEIRA DA GRACA ADVOGADO : PATRÍCIA TAVARES DE OLIVEIRA E OUTRO (S) – SE003532 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA. LOCAÇÃO POR PRAZO INFERIOR A 30 (TRINTA) DIAS. OMISSÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL QUANTO AO CUMPRIMENTO DO REGIMENTO INTERNO E DA CONVENÇÃO COLETIVA, QUE FAZEM LEI ENTRE OS CONDÔMINOS, OS QUAIS NÃO SE OPÕEM A NORMA LEGAL. QUESTÃO OPORTUNAMENTE SUSCITADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA NOVO JULGAMENTO DOS DECLARATÓRIOS. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO (…) In casu, verifico que a utilização dos apartamentos para locação por temporada é uma prática corriqueira e legal, inclusive com previsão no artigo 48 da Lei 8.145/91. (…) Ora, muito bem ponderou o magistrado a quo: (…) o Código Civil assegura aos proprietários o direito de gozar de seus bens. Igualmente, a lei de locações determina que os aluguéis temporários possuem prazo máximo de noventa dias (art. 48). Diante dessas circunstâncias, convém perceber que a norma regimental encontra-se em expresso descompasso com a legislação, pois ao estabelecer apenas um prazo máximo para os alugueis por temporada, a norma, a contrario sensu, autoriza tal instituto por qualquer prazo inferior a este. É evidente o silêncio eloquente do legislador, pois poderia ter estabelecido prazo mínimo, mas contentou-se em apenas ditar o prazo máximo para essa modalidade de contrato.”(…) Desta maneira, não há nenhuma ilegalidade o fato da autora/agravada promover a locação do seu apartamento a pessoas estranhas ao condomínio por curto período de tempo. Inexistente, portanto, plausibilidade nas alegações do recorrente, razão pela qual impõe-se manutenção da decisão agravada. (…)

 (STJ – AREsp: 1174291 SE 2017/0240403-5, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Publicação: DJ 24/11/2017)

Entretanto, apesar dos entendimentos acima, o Tribunal de Pernambuco, em 2016, decidiu por um outro entendimento, controverso à decisão anterior citada, dando outra forma á esta questão, vejamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. LOCAÇÃO POR TEMPORADA DE CÔMODOS EM APARTAMENTO. VIOLAÇÃO À CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. EDIFÍCIO EXCLUSIVAMENTE RESIDENCIAL. USO NOCIVO DA PROPRIEDADE. UTILIZAÇÃO DO IMÓVEL DE MANEIRA PREJUDICIAL À SEGURANÇA, SOSSEGO E BEM ESTAR DOS DEMAIS CONDÔMINOS. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Hipótese em que a ré/agravante promove a locação de cômodos de seu apartamento a pessoas estranhas ao condomínio por curto período de tempo (dias, semanas), mediante veiculação de anúncios e propagandas em sites da internet, com a alteração do nome do condomínio para”ART SUÍTES HOME BOA VIAGEM BEACH”. Tal atividade denota prática nitidamente comercial, destinando o apartamento da agravante a espécie de hospedaria/albergue, o que é vedado pela convenção condominial, que atribui caráter exclusivamente residencial do edifício e veda a destinação diversa das suas unidades imobiliárias. 2. Nos termos do art. 1.333 do Código Civil, a convenção de condomínio é obrigatória a todos os titulares de unidades imobiliárias no edifício. Já o art. 1.336, IV, apregoa que é dever do condômino” dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes “. (…)

 (TJ-PE – AI: 4295245 PE, Relator: José Fernandes, Data de Julgamento: 08/06/2016, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 25/07/2016)

Verifica-se, portanto, que a questão quanto ao direito do propriedade dos condôminos ainda não é decidida de forma pacífica em nossos tribunais.

Como advogado especialista, atuante no Direito Condominial, Direito Empresarial, dentre outras ramificações do Direito Pátrio, compreendo que o entendimento correto a ser dado na questão, não seria pela proibição da locação por temporada nos condomínios, mas sim pela regulamentação desta prática em suas convenções e regimentos internos, com regras claras e rígidas sobre a questão, desse modo, o proprietário não teria seu direito de propriedade maculado e o condomínio poderia evitar futuros conflitos com os condôminos.

Ademais, é preciso observar, ainda, que à partir do momento que o condomínio estabelecer tais regras, é preciso que o proprietário, ao anunciar seu imóvel em sites e aplicativos de locação, deixe bem claro as regras aplicáveis no condomínio.

Senão, em corroboração á todo o exposto supracitado, em recente decisão Processo Nº 0314015-90.2017.8.24.0023, uma moradora de Florianópolis/SC não pode ser impedida pelo condomínio de alugar o próprio apartamento por meio de um aplicativo de hospedagem na internet, o Airbnb. Decisão é da juíza de Direito Ana Paula Amaro da Silveira, da 4ª vara Cível da Capital.

A autora relatou ter sido notificada pelo síndico de que, conforme supostas regras do condomínio, somente seria permitida a locação do imóvel por períodos superiores a 90 dias. A alegação foi de que aluguéis por tempo inferior caracterizariam hospedagem, o que poderia gerar multa condominial.

Sem conseguir resolver a situação de forma amigável, a moradora manifestou na ação que não existe disposição na convenção condominial ou regimento interno contrária à locação de temporada. Assim, ela requereu que o condomínio fosse compelido a se abster de praticar qualquer ato que a impeça de exercer o direito de alugar o imóvel.

Em sua defesa, a administração do condomínio sustentou que a moradora desvirtuava a finalidade residencial do prédio com sua atividade comercial, ao argumento de não se tratar de atividade de locação, nem mesmo por temporada. Acrescentou ainda que a situação traz como consequência a vulnerabilidade aos demais condôminos.

Na sentença, a juíza destacou que a convenção do condomínio não proíbe de maneira expressa a locação por temporada, mas somente alusão ao uso residencial das unidades, vedado o uso comercial, industrial ou profissional, além de atividades que coloquem em risco a segurança e a privacidade dos moradores e do edifício.

Para a magistrada, as locações realizadas pela autora configuram aluguel de temporada, visto que o tempo pelo qual ocorre a ocupação, seja um ou 90 dias (prazo máximo previsto na legislação) não descaracteriza locação quando respeitadas as práticas previstas, ou seja, se não há atividade comercial.

O argumento trazido pelo réu de que a situação deixa o condomínio em situação vulnerável tampouco merece guarida. Isso porque a autora toma todas as cautelas de segurança necessárias, inclusive informa por escrito ao condomínio o ingresso de novos locatários, cabendo assim à administração e zeladoria do condomínio a verificação dos documentos desses.”

A sentença também observa que a moradora e seus locatários estão sujeitos às demais regras e determinações do condomínio, de forma que a proprietária é responsável por eventuais danos gerados pelos ocupantes de sua unidade. Assim, diante da inexistência de cláusula expressa que impeça a locação dos apartamentos na modalidade temporária, ou mesmo que preveja sanção para casos dessa natureza, a Justiça proibiu o condomínio de aplicar qualquer penalidade ou sanção à moradora pelas locações temporárias.

Por outro lado, a juíza acrescentou que a mesma garantia não inclui eventuais decisões de assembleia condominial, uma vez que o direito à propriedade da unidade autônoma não é irrestrito.

Ao final, como advogado especialista em tais demandas, como também diante de vastas controvérsias sobre o assunto, se faz de suma importância compreender que a multa de condomínio ainda é um assunto bastante polêmico e que causa estresse imenso, seja para o condomínio, ou seja, para o síndico. No entanto para ambos se faz de suma importância aconselhar quanto as corretas aplicações de multas e sanções para os condôminos, justamente para se evitar que determinados transtornos, se transformem em grande bolas de neve.

É importante sempre agir de acordo com o Código Civil, observar e analisar precisamente o regulamento interno e a convenção do condomínio.

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