Condomínio Não Pode Impedir Proprietário de Sublocar Seu Imóvel Por Aplicativo para Uso de Temporada
Em primeiro plano, cumpre-se observar que síndicos e moradores diariamente discutem sobre as mais variadas questões em condomínios, desse modo, aplicar multas de condomínio é uma das partes mais complicadas do trabalho do síndico, no entanto, ultimamente muito vem se debatendo entre alguns condomínios é sobre a utilização do imóvel residencial, no que diz respeito ao direito de propriedade de cada proprietário, no que tange ao direito do uso, do gozo, de fruição e de disposição do seu bem imóvel para locação por temporada, através de sites e aplicativos.
Ao aplicar, uma advertência ou multa, a primeira coisa que deve ser observada pelo síndico antes de tomar qualquer decisão é de conferir a convenção e regimento interno do condomínio, documentos estes, elaborados e confeccionados pelo condomínio, analisados por um advogado especialista em Direito Condominial, a fim de melhor estabilizar as relações condominiais .
Todavia, existem situações em que advertências não surtem efeito e deve-se partir direto para a multa de condomínio, no entanto, ao caso do morador que vir a causar prejuízo a uma área comum do condomínio, este deverá se utilizar das medidas necessárias e cabíveis conforme deve constar em convenção a fim de se buscar o devido ressarcimento pelo dano causado, senão, vejamos o dispõe o Código Civil/2002, capítulo que trata sobre Condomínios:
Art. 1336…..
- 2o. O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.
Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
- Único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.
Neste ínterim, no que tange ao direito de propriedade, uso e gozo da propriedade do condômino, o que atualmente tem gerado muita dúvida é se pode ou não o condomínio proibir que o proprietário utilize seu imóvel para a locação por temporada?
Neste sentido deve-se dizer, que antes de se adentrar para responder à questão acima é preciso entender o que a Lei 8.245/91, entende por locação por temporada é preciso observar o diz o artigo 48 do supracitado dispositivo legal, vejamos:
Art. 48. Considera – se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.
Como pode-se observar, a grosso modo a locação por temporada é aquela que corresponde ao período de locação de até 90 (noventa) dias e sem prazo mínimo. Outrossim, é preciso, ainda, observar o que diz o Código Civil sobre o direito do proprietário de um imóvel, vejamos:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Conforme observado, o direito de propriedade do proprietário do imóvel, por lei, abrange o direito do uso, do gozo, de fruição e de disposição. Ou seja, o proprietário do imóvel tem o direito, por exemplo, de alugar o imóvel e receber os alugueis, acrescento ainda que, a Constituição Federal garante, em seu art. 5º, XXII o direito de propriedade.
Sendo assim, em que pese o condomínio possuir áreas comuns, que devem se sujeitar a regras da coletividade de moradores, os apartamentos ou casas, áreas estas consideradas privativas, sujeitam-se ao direito de propriedade de cada proprietário, no entanto, de fato que sua utilização deve ser feita com bom senso, de forma a não ofender, nem desrespeitar direito alheio, como por exemplo, não se pode extrapolar no barulho em horários inapropriados de forma a prejudicar o vizinho.
No caso em análise, a questão que se faz de suma importância esclarecer, diz respeito ao fato do por que razão alguns condomínios pretendem proibir a utilização da propriedade dos condôminos para a locação por temporada.
A justificativa mais plausível quanto a locação por temporada, diz respeito á segurança do condomínio e á garantia ao respeito dos demais condôminos, a utilização destes imóveis por temporada sem determinação de período mínimo, e de até 90 (noventa dias), leva a uma alta rotatividade de pessoas nos condomínios, o que pode prejudicar a segurança destes locais.
Este tema, tem causado diversas discursões e controvérsias nos tribunais brasileiros, não muito recente, o Superior Tribunal de Justiça, em 2017, decidiu que o condomínio não pode proibir a locação por temporada, tendo em vista que prevista em lei, confira a breve ementa comentada:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.174.291 – SE (2017/0240403-5) RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE AGRAVANTE : CONDOMÍNIO RESIDENCIAL CLUBE ATALAIA ADVOGADO : ROBERTO BALDO CUNHA E OUTRO (S) – SE000046B AGRAVADO : TEREZA CRISTINA CERQUEIRA DA GRACA ADVOGADO : PATRÍCIA TAVARES DE OLIVEIRA E OUTRO (S) – SE003532 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA. LOCAÇÃO POR PRAZO INFERIOR A 30 (TRINTA) DIAS. OMISSÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL QUANTO AO CUMPRIMENTO DO REGIMENTO INTERNO E DA CONVENÇÃO COLETIVA, QUE FAZEM LEI ENTRE OS CONDÔMINOS, OS QUAIS NÃO SE OPÕEM A NORMA LEGAL. QUESTÃO OPORTUNAMENTE SUSCITADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA NOVO JULGAMENTO DOS DECLARATÓRIOS. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO (…) In casu, verifico que a utilização dos apartamentos para locação por temporada é uma prática corriqueira e legal, inclusive com previsão no artigo 48 da Lei 8.145/91. (…) Ora, muito bem ponderou o magistrado a quo: (…) o Código Civil assegura aos proprietários o direito de gozar de seus bens. Igualmente, a lei de locações determina que os aluguéis temporários possuem prazo máximo de noventa dias (art. 48). Diante dessas circunstâncias, convém perceber que a norma regimental encontra-se em expresso descompasso com a legislação, pois ao estabelecer apenas um prazo máximo para os alugueis por temporada, a norma, a contrario sensu, autoriza tal instituto por qualquer prazo inferior a este. É evidente o silêncio eloquente do legislador, pois poderia ter estabelecido prazo mínimo, mas contentou-se em apenas ditar o prazo máximo para essa modalidade de contrato.”(…) Desta maneira, não há nenhuma ilegalidade o fato da autora/agravada promover a locação do seu apartamento a pessoas estranhas ao condomínio por curto período de tempo. Inexistente, portanto, plausibilidade nas alegações do recorrente, razão pela qual impõe-se manutenção da decisão agravada. (…)
(STJ – AREsp: 1174291 SE 2017/0240403-5, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Publicação: DJ 24/11/2017)
Entretanto, apesar dos entendimentos acima, o Tribunal de Pernambuco, em 2016, decidiu por um outro entendimento, controverso à decisão anterior citada, dando outra forma á esta questão, vejamos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. LOCAÇÃO POR TEMPORADA DE CÔMODOS EM APARTAMENTO. VIOLAÇÃO À CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. EDIFÍCIO EXCLUSIVAMENTE RESIDENCIAL. USO NOCIVO DA PROPRIEDADE. UTILIZAÇÃO DO IMÓVEL DE MANEIRA PREJUDICIAL À SEGURANÇA, SOSSEGO E BEM ESTAR DOS DEMAIS CONDÔMINOS. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Hipótese em que a ré/agravante promove a locação de cômodos de seu apartamento a pessoas estranhas ao condomínio por curto período de tempo (dias, semanas), mediante veiculação de anúncios e propagandas em sites da internet, com a alteração do nome do condomínio para”ART SUÍTES HOME BOA VIAGEM BEACH”. Tal atividade denota prática nitidamente comercial, destinando o apartamento da agravante a espécie de hospedaria/albergue, o que é vedado pela convenção condominial, que atribui caráter exclusivamente residencial do edifício e veda a destinação diversa das suas unidades imobiliárias. 2. Nos termos do art. 1.333 do Código Civil, a convenção de condomínio é obrigatória a todos os titulares de unidades imobiliárias no edifício. Já o art. 1.336, IV, apregoa que é dever do condômino” dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes “. (…)
(TJ-PE – AI: 4295245 PE, Relator: José Fernandes, Data de Julgamento: 08/06/2016, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 25/07/2016)
Verifica-se, portanto, que a questão quanto ao direito do propriedade dos condôminos ainda não é decidida de forma pacífica em nossos tribunais.
Como advogado especialista, atuante no Direito Condominial, Direito Empresarial, dentre outras ramificações do Direito Pátrio, compreendo que o entendimento correto a ser dado na questão, não seria pela proibição da locação por temporada nos condomínios, mas sim pela regulamentação desta prática em suas convenções e regimentos internos, com regras claras e rígidas sobre a questão, desse modo, o proprietário não teria seu direito de propriedade maculado e o condomínio poderia evitar futuros conflitos com os condôminos.
Ademais, é preciso observar, ainda, que à partir do momento que o condomínio estabelecer tais regras, é preciso que o proprietário, ao anunciar seu imóvel em sites e aplicativos de locação, deixe bem claro as regras aplicáveis no condomínio.
Senão, em corroboração á todo o exposto supracitado, em recente decisão Processo Nº 0314015-90.2017.8.24.0023, uma moradora de Florianópolis/SC não pode ser impedida pelo condomínio de alugar o próprio apartamento por meio de um aplicativo de hospedagem na internet, o Airbnb. Decisão é da juíza de Direito Ana Paula Amaro da Silveira, da 4ª vara Cível da Capital.
A autora relatou ter sido notificada pelo síndico de que, conforme supostas regras do condomínio, somente seria permitida a locação do imóvel por períodos superiores a 90 dias. A alegação foi de que aluguéis por tempo inferior caracterizariam hospedagem, o que poderia gerar multa condominial.
Sem conseguir resolver a situação de forma amigável, a moradora manifestou na ação que não existe disposição na convenção condominial ou regimento interno contrária à locação de temporada. Assim, ela requereu que o condomínio fosse compelido a se abster de praticar qualquer ato que a impeça de exercer o direito de alugar o imóvel.
Em sua defesa, a administração do condomínio sustentou que a moradora desvirtuava a finalidade residencial do prédio com sua atividade comercial, ao argumento de não se tratar de atividade de locação, nem mesmo por temporada. Acrescentou ainda que a situação traz como consequência a vulnerabilidade aos demais condôminos.
Na sentença, a juíza destacou que a convenção do condomínio não proíbe de maneira expressa a locação por temporada, mas somente alusão ao uso residencial das unidades, vedado o uso comercial, industrial ou profissional, além de atividades que coloquem em risco a segurança e a privacidade dos moradores e do edifício.
Para a magistrada, as locações realizadas pela autora configuram aluguel de temporada, visto que o tempo pelo qual ocorre a ocupação, seja um ou 90 dias (prazo máximo previsto na legislação) não descaracteriza locação quando respeitadas as práticas previstas, ou seja, se não há atividade comercial.
“O argumento trazido pelo réu de que a situação deixa o condomínio em situação vulnerável tampouco merece guarida. Isso porque a autora toma todas as cautelas de segurança necessárias, inclusive informa por escrito ao condomínio o ingresso de novos locatários, cabendo assim à administração e zeladoria do condomínio a verificação dos documentos desses.”
A sentença também observa que a moradora e seus locatários estão sujeitos às demais regras e determinações do condomínio, de forma que a proprietária é responsável por eventuais danos gerados pelos ocupantes de sua unidade. Assim, diante da inexistência de cláusula expressa que impeça a locação dos apartamentos na modalidade temporária, ou mesmo que preveja sanção para casos dessa natureza, a Justiça proibiu o condomínio de aplicar qualquer penalidade ou sanção à moradora pelas locações temporárias.
Por outro lado, a juíza acrescentou que a mesma garantia não inclui eventuais decisões de assembleia condominial, uma vez que o direito à propriedade da unidade autônoma não é irrestrito.
Ao final, como advogado especialista em tais demandas, como também diante de vastas controvérsias sobre o assunto, se faz de suma importância compreender que a multa de condomínio ainda é um assunto bastante polêmico e que causa estresse imenso, seja para o condomínio, ou seja, para o síndico. No entanto para ambos se faz de suma importância aconselhar quanto as corretas aplicações de multas e sanções para os condôminos, justamente para se evitar que determinados transtornos, se transformem em grande bolas de neve.
É importante sempre agir de acordo com o Código Civil, observar e analisar precisamente o regulamento interno e a convenção do condomínio.
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