STJ autoriza indisponibilidade de bens de participantes do ilícito que não constam no polo passivo da execução fiscal

Por Dr. Wander Barbosa em

Em primeiro plano, cumpre observar inicialmente que, o Crime de Sonegação Fiscal, definido no art. 1º da Lei 8.137/90, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, guardam uma estreita relação jurídica e legal. Nesta esteira, se faz de suma importância salientar a despeito de alguns efeitos legais correlacionados à tipicidade da sonegação fiscal e a seara do direito tributário.

Vejamos, a seguir, o teor do artigo 1º da Lei nº 8.137/90:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (Vide Lei nº 9.964, de 10.4.2000)

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Conforme aludido acima, fica caracterizado explicitamente, que, o referido delito é um crime material ou também crime de resultado. Portanto, em razão da natureza do crime de sonegação fiscal, seja ele material ou de resultado, é primordial a ocorrência do lançamento definitivo do tributo para que concretize a condição objetiva de punibilidade ao contribuinte, pois, o crédito tributário, irregularmente constituído, terá uma eficácia inapta e a sua exigibilidade será excluída.

Nesta análise, cumpre-se frisar que a medida cautelar fiscal tem por objetivo gravar o patrimônio de obrigado tributário com cláusula de indisponibilidade, de modo a impedir alienação de tais bens. A pretensão formatada, permite o uso e o gozo dos bens, mas impede a parte requerida de movimentar o patrimônio em foco, obstando venda, doação, troca, cessão e qualquer outros negócios ou formatos jurídicos, gratuito ou oneroso, que resulte mudança da titularidade dos respectivos bens móveis e imóveis, até que sejam pagos, ou até mesmo definitivamente extintos os créditos tributários em execução.

Nesse contexto, após decisão liminar, principalmente na medida cautelar fiscal, a cláusula de indisponibilidade deve gravar bens suficientes para a garantia do crédito tributário relacionado, à qual se efetua mediante a penhora que seja ordenada e efetuada nos autos de execução fiscal.

A caracterização do periculum in mora e do fumus boni juris está diretamente relacionada com as circunstâncias de cada caso, mas, deve se enquadrar no rol do Art. 2°, da Lei n° 8.397/1992.

Neste sentido deve-se dizer que sonegar é o ato realizado visando suprimir ou reduzir tributo, mediante omissão, fraude, falsificação, alteração, adulteração ou ocultação.

Como advogado empresarial, atuante no Direito Tributário e Direito Penal Econômico, esclareço que se o contribuinte pretende diminuir os seus encargos tributários, poderá fazê-lo de forma legal, a maneira legal chama-se elisão fiscal ou através de um planejamento tributário, no entanto, erroneamente optar por decidir isto de forma ilegal, considerando-se pelo ordenamento jurídico como um crime de sonegação ou evasão fiscal.

A fraude ou sonegação fiscal consiste em utilizar procedimentos que violem diretamente a lei fiscal ou o regulamento fiscal. Desta forma, conscientemente, um contribuinte age no intuito de beneficiar a si ou terceiros pela sonegação.

A sonegação é um ilícito tributário que, além da multa prevista, enquadra-se também como crime diante de tipos descritos no direito penal, sendo por este também punidos, por serem considerados ilícitos penais tributários.

De um modo geral, os ilícitos tributários, representativos do descumprimento de uma lei fiscal, podem se originar de 3 espécies de infração:

1) Infração exclusivamente tributária, assim entendida aquela descrita apenas na lei fiscal, por exemplo, da aplicação errada de uma alíquota do ICMS menor que a correta, hipótese em que aplica-se tão somente uma sanção administrativo-fiscal calculada, em regra, sobre a diferença não recolhida aos cofres públicos estaduais.

2) Infração simultaneamente tributária e penal, o que ocorre, por exemplo, quando um contribuinte falsifica uma Nota Fiscal ou uma guia de recolhimento de um tributo. Esse ato sujeitará o infrator a um procedimento administrativo, mais precisamente a um Auto de Infração, no qual será exigido o efetivo pagamento do tributo e da correspondente penalidade, além da aplicação da sanção prevista na lei penal em razão dessa falsificação ser também tipificada como um ilícito penal, um crime, a ser apurado e decidido através de um processo judicial.

3) Infração puramente penal, onde o ato ilícito praticado está apenas descrito como crime ou contravenção na lei penal, sem qualquer enquadramento na lei tributária.

A pena de ilícitos tributários, caracterizados como sonegação, pode variar de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, além da multa – que pode atingir até 225%, conforme artigo 1º da Lei 8.137/1990 e artigo 44 da Lei 9.430/1996.

Impende salientar que na ocorrência de fraude para oportunizar sonegação fiscal ou esvaziamento patrimonial dos reais devedores autoriza que o juízo da execução estenda a medida de indisponibilidade de bens para além do crédito de um título executivo (CDA), de forma a garantir todos os débitos tributários gerados pelas pessoas participantes da situação ilícita.

Com base nesse entendimento, em REsp nº 1656172 / MG (2017/0040301-2) autuado em 24/02/2017, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atendeu parcialmente a um recurso da Fazenda Nacional para cassar em parte o acórdão recorrido e determinar que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) analise novamente o pedido de indisponibilidade de bens quanto às demais pessoas indicadas na cautelar fiscal.

O TRF1 limitou a medida de indisponibilidade de bens ao processo executivo fiscal do qual a cautelar fiscal é incidente, não admitindo que a medida alcançasse pessoas não integrantes do polo passivo. A Fazenda recorreu alegando, entre outros pontos, que a medida de indisponibilidade deveria ser no valor total dos débitos tributários do grupo econômico, já que o grupo teria buscado sonegação fiscal e esvaziamento patrimonial dos reais devedores.

Segundo o ministro Gurgel de Faria, relator do caso, tratando-se de atos fraudulentos, a indisponibilidade de bens decorrente da medida cautelar fiscal não encontra limite no ativo permanente a que se refere o parágrafo 1º do artigo 4º da Lei 8.397/1992.

Redirecionamento

“Havendo prova da ocorrência de fraude por grupo de pessoas físicas e/ou jurídicas, como a criação de pessoas jurídicas fictícias para oportunizar a sonegação fiscal ou o esvaziamento patrimonial dos reais devedores, o juízo da execução pode redirecionar a execução fiscal às pessoas envolvidas”, explicou o relator.

Ele afirmou que nessas hipóteses a análise será feita pelo juízo competente com base no poder geral de cautela e dentro dos limites e das condições impostas pela legislação – o que permite ao juiz da causa “estender a ordem de indisponibilidade para garantia de todos os débitos tributários gerados pelas pessoas participantes da situação ilícita”.

O relator destacou que, em caso de atos fraudulentos, a medida de indisponibilidade de bens pode ser ampla.

“Em se tratando de atos fraudulentos, a indisponibilidade de bens decorrente da medida cautelar fiscal não encontra limite no ativo permanente, podendo atingir quaisquer bens, direitos e ações da pessoa jurídica e, eventualmente, dos sócios, nos termos do artigo 11 da Lei 6.830/1980”.

Sonegação

Gurgel de Faria destacou que, ao analisar as provas do caso, o TRF1 deixou consignada a existência de indícios de formação de grupo econômico com o objetivo de sonegação fiscal, além de “fortes indícios de fraude”, situação caracterizada pela criação pulverizada de pessoas jurídicas para simular relações inexistentes e ocultar fatos geradores de obrigação tributária.

O ministro destacou a jurisprudência do tribunal no sentido de que o mero fato de pessoas jurídicas pertencerem a um mesmo grupo econômico não enseja, por si só, a responsabilidade solidária dessas entidades.

“Todavia, assim como acontece com as pessoas físicas, ocorrendo qualquer das hipóteses previstas no Código Tributário Nacional para responsabilização pessoal de terceiros (por exemplo, artigos 124, 134 e 135), a execução fiscal pode ser redirecionada ao responsável, ficando este, portanto, passível de alcance das medidas constritivas do processo executivo”, concluiu o ministro.

Ao final, como advogado especializado à longa data nestas ramificações do Direito, compreendo que com base nessas premissas, é razoável a reflexão jurisprudencial acerca do instituto do redirecionamento, devendo o judiciário, na aplicação da lei ao caso concreto, estabelecer mecanismos no sentido de ampliar o alcance objetivo da lei, buscando a efetivação do modelo de estado social que propõe a Carta Magna, visto que, a sonegação fiscal não atinge somente a União e os cofres públicos, atinge a sociedade como um todo, quando o contribuinte deixa de recolher o tributo representa uma verdadeira apropriação dos recursos públicos que deveriam ser investidos na saúde, na segurança, na educação, enfim, a sonegação e a evasão fiscal tem como vítima a toda a coletividade, ofendendo assim ao Estado como um todo.

Engana-se o contribuinte que crê que sua conduta, ao sonegar, não será detectada. Atualmente, os diversos agentes fiscalizatórios têm à mão muitos instrumentos que possibilitam detectar a sonegação fiscal. Os contribuintes precisam organizar seus procedimentos e atividades, visando excluir de suas condutas qualquer ato considerado como sonegação.

A primeira orientação é conhecer adequadamente a legislação tributária, visando atendê-la de forma correta, organizando a contabilidade e a escrituração fiscal. Outra forma é utilizar o planejamento tributário, como ferramenta de redução de custos.

Tal planejamento, quando feito de forma profissional e responsável, pode reduzir encargos tributários de forma lícita, sem risco para o contribuinte.

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