STJ pacífica entendimento que “Convivência com expectativa de formar família no futuro não configura união estável”

Por Dr. Wander Barbosa em

Por conta do entendimento de que o núcleo de afeto permite o reconhecimento de uma união familiar, pessoas tem, de modo cada vez mais frequente entabulado contratos de namoro, de namoro qualificado e de união estável.

Contratos de namoro qualificado, namoro qualificado e união estável

O fato de namorados projetarem constituir família no futuro não caracteriza união estável, ainda que haja coabitação. Isso porque essas circunstâncias não bastam à verificação da affectio maritalis.

 “O propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável – a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado ‘namoro qualificado’ -, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída.”

Como o Brasil é um celeiro de operadores do direito, com grande número de faculdades, lançando muitos profissionais no mercado. Nesse contexto, se faz excepcionalmente necessário, o conhecimento da técnica material e processual, eis que, pequenas atitudes ou comportamentos podem alterar substancialmente o alcance das consequências de uma dada relação jurídica, não saber de detalhes pode ser curial para ser lançado em demandas ruinosas.

Há vários tipos de família reconhecidos no Direito de Família brasileiro, desde há muito que não nos atemos apenas e tão somente aos modelos de família formal e matrimonial, para aqueles que tenham um viés mais conservador e, sobretudo, as pessoas afeitas ao cumprimento de regras religiosas.

Como é bem sabido o Estado é laico, mas simplesmente não se pode negar a validade de regras que prestigiem o fenômeno cultural, onde a própria Consagrada Carta Magna prestigia o direito de liberdade religiosa.

Pelo óbvio a constituição de família matrimonial pode ser também uma opção para os não conservadores ou mesmo para ateus, é uma questão de opção. Mas, a par da existência de famílias formais, àquelas com a ideia de um vínculo matrimonial e formação de uma sociedade conjugal com seus direitos e deveres, o direito tutela, na mesma medida, a família informal.

Numa visão do início da formulação técnica do conceito de união estável, o que se observava seria o fenômeno de se separar a união estável da relação de concubinato, pelo simples fato de que, na primeira, não haveria impedimento para o casamento, situação evidenciada no segundo caso.

Vem daí a ideia de que a concubina, conceito a que se agregou carga ideológica negativa, seria a “amante” ou o concubino seria o “amante”, eis que como estaria se relacionando com pessoa já casada, havendo impedimento para que se casasse novamente, a união havida entre eles não seria passível de tutela para o direito, eis que haveria uma ideia de família monogâmica conforme previsão do artigo 226 da CF/88, com referência à união de um homem com uma mulher.

Quando não havia impedimento para o casamento, por exemplo, duas pessoas solteiras, que poderiam se casar, se o quisessem, não haveria uma mácula ao conceito de família informal, vindo, daí, a ideia de ser possível uma união estável, diversa da situação de um concubinato.

No entanto, eis que a legislação civil estabelece que o separado de fato (pessoa formalmente casada) poderia constituir união estável, vindo daí questionamentos no sentido de que a união estável não seria tão fácil, assim, de se separar de uma união concubinária, apenas e tão somente por conta do requisito impedimento matrimonial.

Observe-se a ênfase que se dá, no texto legal, em sua parte final no sentido de que: “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Parte-se, portanto, desse marco diferencial seria a intenção, ou não, de se constituir família conforme disposto no artigo 1.723 CC, parte final, se houve intenção haverá união estável, hétero ou homoafetiva.

Se não houve tal intenção, o caso poderá ser de um namoro ou de um namoro qualificado, onde o namoro qualificado seria a figura criada pelo Superior Tribunal de Justiça, para designar situações em que os namorados moram sob um mesmo teto, mas continuam sem a intenção de constituir família.

Neste sentido, a 3ª turma do STJ, seguindo o relator, o ministro Marco Aurélio Bellizze, em Recurso Especial Nº 1.454.643 – RJ 2014/0067781-5, deu provimento ao recurso de um homem que sustentava ter sido namoro, e não união estável, o período de mais de dois anos de relacionamento que antecedeu o casamento entre ele e a ex-mulher. Ela reivindicava a metade de apartamento adquirido pelo então namorado antes de se casarem.

Depois de perder em 1ª instância, o ex-marido interpôs recurso de apelação, que foi acolhido por maioria no TJ/RJ. Como o julgamento da apelação não foi unânime, a ex-mulher intentou embargos infringentes e obteve direito a um terço do apartamento, em vez da metade, como queria. Inconformado, o homem recorreu ao STJ.

No exterior

Quando namoravam, ele aceitou oferta de trabalho e mudou-se para o exterior. Meses depois, em janeiro de 2004, a namorada, a estudo, foi morar com ele no mesmo imóvel.

Em outubro de 2004, ainda no exterior – onde permaneceram até agosto do ano seguinte –, ficaram noivos. Ele comprou, com dinheiro próprio, um apartamento no Brasil, para servir de residência a ambos. Em setembro de 2006, casaram-se em comunhão parcial. Dois anos mais tarde, veio o divórcio.

A mulher, alegando que o período entre sua ida para o exterior, em janeiro de 2004, e o casamento, em setembro de 2006, foi de união estável, e não apenas de namoro, requereu, além do reconhecimento da união, a divisão do apartamento.

Núcleo familiar

Ao contrário da corte estadual, o ministro Bellizze concluiu que não houve união estável, “mas sim namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram, para o futuro – e não para o presente –, o propósito de constituir entidade familiar”. De acordo com o ministro, a formação da família, em que há o “compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material”, tem de ser concretizada, não somente planejada, para que se configure a união estável.

“Tampouco a coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício), especialmente se considerada a particularidade dos autos, em que as partes, por contingências e interesses particulares (ele, a trabalho; ela, pelo estudo) foram, em momentos distintos, para o exterior, e, como namorados que eram, não hesitaram em residir conjuntamente. Este comportamento, é certo, revela-se absolutamente usual nos tempos atuais, impondo-se ao Direito, longe das críticas e dos estigmas, adequar-se à realidade social.”

Por fim, o relator considerou que, caso os dois entendessem ter vivido em união estável naquele período anterior, teriam escolhido outro regime de casamento, que abarcasse o único imóvel de que o casal dispunha, ou mesmo convertido em casamento a alegada união estável.

Em corroboração, a orientação lançada como premissa número 2, da edição 50 da ferramenta Jurisprudência em Teses, do STJ, dedicada à união estável:

“A coabitação não é elemento indispensável à caracterização da união estável” (precedentes citados: STJ, Ag. Rg. no AREsp 649.786/GO, Rel. ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, julgado em 4/8/2015, DJE 18/8/2015; Ag. Rg. no AREsp 223.319/RS, Rel. ministro Sidnei Beneti, 3ª Turma, julgado em 18/12/2012, DJE4/2/2013; Ag. Rg. no AREsp 59.256/SP, Rel. ministro Massami Uyeda, 3ª Turma, julgado em 18/9/2012, DJE 4/10/2012; Ag. Rg. nos EDcl. no REsp 805265/AL, Rel. ministro Vasco Della Giustina (desembargador convocado do TJ/RS), 3ª Turma, julgado em 14/9/2010, DJE 21/9/2010, REsp 1.096.324/RS, Rel. ministro Honildo Amaral de Mello Castro (desembargador convocado do TJ/AP), 4ª Turma, julgado em 2/3/2010, DJE 10/5/2010, e REsp 275.839/SP, Rel. ministro Ari Pargendler, Rel. p/ Acórdão ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, julgado em 2/10/2008, DJE 23/10/2008).

De fato, morar ou não, debaixo de um mesmo teto, inclusive, não seria elemento necessário nem mesmo para uma família formal, matrimonial, mais tradicionalista e conservadora, são muitos casais, por exemplo, que trabalham em cidades distintas e se encontram apenas em finais de semana e feriados. Não faria sentido exigir isso em uma união que, por definição, seria considerada família informal.

Desse modo, não basta morar sob um mesmo teto para que se presuma a intenção de constituir família e haver união estável, e justamente por este motivo, atualmente existe um grande número de pessoas buscando a formalização destas espécies de contratos de namoro para evitar disputas sobretudo patrimoniais em caso de fim de relacionamento.

Isso porque, em se cuidando de pessoas maiores e capazes, dispondo sobre direitos patrimoniais, o que for ajustado em relação ao patrimônio prevalecerá, independentemente de ter havido, ou não, concurso para a construção de algum bem, em situação reiterada pela jurisprudência do mesmo STJ neste ano.


Dr. Wander Barbosa

Wander Barbosa, CEO do escritório Wander Barbosa Sociedade de Advocacia. Master Of Law Direito Empresarial. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil. Pós Graduado em Direito Penal. Especializado em Recuperação Judicial e Falências pela Escola Paulista da Magistratura.

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